05/01/2021
O centro de eventos de Itajaí ficou lotado em 7 de julho. Ao longo do dia todo, moradores da cidade de Santa Catarina fizeram fila para levar para casa doses de ivermectina. A Prefeitura comprou milhões de comprimidos do remédio, que é usado contra parasitas, para distribuir à população como prevenção para a covid-19, a doença causada pelo novo coronavírus. Várias cidades do país já fizeram igual e outras disseram que pretendem fazer o mesmo. A procura pelo medicamento também aumentou entre a população em geral. As buscas no Google dispararam. Em algumas farmácias, ele sumiu das prateleiras. E as fabricantes reforçaram a produção para dar conta da demanda. Esse interesse parece ter sido resultado de uma série de fatores. Um estudo preliminar feito em laboratório teve bons resultados. O acesso a outros remédios alardeados como uma suposta cura para a covid-19 passou a ser controlado. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) fez menções à ivermectina, e muitas mensagens circularam no WhatsApp recomendando seu uso "para prevenir o contágio". Além disso, alguns médicos vêm recomendando, nos consultórios e na internet, que as pessoas a tomem para evitar ou tratar a covid-19. Mas tudo isso parece ignorar um fato simples, mas importante: não há até agora comprovação científica de que a ivermectina - ou qualquer outro medicamento - previna ou trate a covid-19. "A ivermectina é hoje o que a cloroquina era em março. As pessoas se convenceram de que ela pode ter algum efeito (contra a covid-19) e foram atrás de forma descontrolada", diz a infectologista Raquel Stucchi, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A ivermectina é comercializada desde o início dos anos 1980 para combater verminoses e parasitas, como piolhos, pulgas e carrapatos, em animais e seres humanos. O medicamento atua no sistema nervoso central dos vermes e parasitas, provocando paralisia, e costuma ser usado em dose única. Stucchi conta que há mais ou menos seis semanas começou a receber mensagens de conhecidos e pacientes em busca de informações sobre a medicação. "Elas perguntam se devem tomar porque souberam que todo mundo está tomando. Nunca tinha ouvido falar em pessoas pedindo ivermectina em 40 anos de profissão", diz Stucchi. A infectologista afirma que a grande procura ocorre, em parte, porque é um remédio barato e que costuma causar poucos efeitos colaterais. Mas também atribui isso a colegas de profissão que têm indicado seu uso aos pacientes. Stucchi cita o caso de uma amiga que foi à dermatologista para renovar receitas de cremes e saiu da consulta com uma receita para ivermectina. A dermatologista disse que ficava a critério da paciente usar ou não, mas que tinha receitado porque se sentia na obrigação de avisar que acreditava que o medicamento previne a covid-19. "Não sei de onde tiraram isso, porque essa informação não existe. Acho que é porque as pessoas estão desesperadas por uma cura e aconteceu um movimento muito bem planejado de divulgar a ivermectina como se ela fosse esse milagre", diz Stucchi.'As pessoas estão desesperadas'
BBC