05/01/2021
"Ele me bateu forte duas vezes, me machucou toda, me ameaçou com faca, me arranhou, isso só porque me pegou conversando com a nossa terapeuta de casal no Facebook", relata a carioca Elaine*. "Ele chegou um dia e me disse que já tinha acertado tudo com o dono de uma boate e eu iria ser garota que faz striptease", conta a potiguar Katrina*. "Ele fazia violência psicológica (...) progredia com doses homeopáticas. A cada dia testava um pouquinho mais: me chamava de burra, de gorda, de feia, de incapaz. Tudo para me desmoralizar e me fazer submissa.", relembra a paulista Ariadne*. Imigrantes, vítimas de violência física e psicológica praticada pelo companheiro: assim é a realidade de muitas mulheres que sonham viver um conto de fadas com um amor europeu, mas acabam vítimas dos próprios sonhos. Segundo dados do Itamaraty repassados à BBC News Brasil, de janeiro de 2019 até novembro de 2020 foram relatados 213 episódios de violência doméstica e tráfico de seres humanos com vítimas brasileiras no exterior. O número verdadeiro pode ser maior, pois há subnotificação de casos dessa natureza. A cada ano, 50 mil mulheres são assassinadas no mundo, vítimas de violência doméstica. Isso representa aproximadamente uma morte a cada dez minutos de acordo com dados da Organização das Nações Unidas (ONU). Mundialmente, mais da metade dessas vítimas (58%) é morta por homens próximos, como pais, irmãos ou parceiros. Os maridos e ex-companheiros são os principais assassinos e respondem por 1 em cada 3 mortes. Os dados revelam que justamente no núcleo no qual as mulheres deveriam ser mais protegidas é onde acabam por sofrer as violações. A enfermeira Elaine* sabe bem disso. Ela sobreviveu à violência psicológica e às agressões físicas do ex-marido suíço. Ele era ciumento e a forçava a comer após as brigas como um gesto de paz. "Ele se desculpava me empanturrando de comida. Cheguei a comer uma barra de 500g de chocolate por dia. Só no café da manhã eu engolia (...) mais de 1 litro de suco de laranja", recorda. "Depois de cinco anos de casada eu pesava 120kg, quando o meu normal era 65Kg. Era tanto ressentimento, que eu gerei uma segunda pessoa dentro de mim", relembra Elaine. Quando a brasileira decidiu fazer uma cirurgia bariátrica, de redução de estômago, teve que agir em segredo porque o ex era contra. A independência dela gerou fúria nele. O casal buscou aconselhamento, mas em novembro de 2013 Elaine* desistiu quando, além de sofrer agressões psicológicas, apanhou duas vezes. A enfermeira saiu da casa escoltada pela polícia suíça, que a ajudou a recolher os pertences. A carioca sumiu da vida do ex para salvar a própria vida com dieta e exercícios. Sete anos depois, 60kg mais magra e esbanjando saúde, Elaine sente que deu a volta por cima. Oficializou o divórcio, fez cirurgias plásticas, dois cursos profissionalizantes de enfermagem e terapia. "Reconquistei a minha autoestima, a independência financeira e psicológica. Pago as minhas contas, gosto de namorar, viajo e sou muito bem resolvida". A reportagem tentou contatar o ex-marido, mas não obteve retorno até a publicação. Em documentos, cuja autenticidade foi confirmada pela polícia, consta que a brasileira sofreu agressões em casa.Parceiros do mal
BBC