Paula Sauer, planejadora financeiro CFP pela Planejar
Nos últimos anos, a humanização dos pets e o conceito de famílias multiespécies têm se tornado cada vez mais comuns no Brasil. Como alguém que observa atentamente as mudanças sociais e econômicas, não posso ignorar a crescente influência desse fenômeno na economia do país. Meu próprio prédio na zona oeste de São Paulo, onde há mais animais de estimação do que crianças, é um microcosmo dessa tendência.
O Brasil, atualmente o terceiro maior mercado pet do mundo, possui cerca de 149,6 milhões de animais de estimação, representando aproximadamente 70% da população. A humanização dos pets, que os transforma em verdadeiros membros da família, é evidente não apenas no comportamento dos donos, mas também nas leis e no mercado. O Projeto de Lei 179/23, que está em tramitação, reflete essa mudança ao reconhecer legalmente os animais de estimação como sujeitos de direito. A lei prevê, entre outras coisas, a possibilidade de que os pets herdem bens e tenham regulamentações específicas em casos de divórcio ou separação. Este avanço legislativo é um reflexo direto da crescente importância dos animais em nossas vidas e do desejo de protegê-los e assegurar seus direitos.
O impacto econômico da humanização dos pets é significativo e multifacetado. Em 2024, estima-se que o mercado pet brasileiro movimente cerca de R$ 78,2 bilhões. Esse crescimento é impulsionado por três áreas principais: alimentação, serviços e saúde, e produtos e acessórios. A alimentação representa cerca de 60% desse mercado, com uma demanda crescente por alimentos especializados e de alta qualidade. Os donos de pets estão dispostos a investir em produtos que garantam a saúde e o bem-estar de seus animais, o que reflete uma mudança na forma como os pets são percebidos e tratados.
Os serviços veterinários e de saúde, incluindo consultas, tratamentos e seguros, devem movimentar aproximadamente R$ 15,6 bilhões em 2024. Essa crescente preocupação com a saúde dos pets demonstra uma mudança na mentalidade dos donos, que cada vez mais veem seus animais como parte integral de suas famílias, merecendo cuidados médicos de qualidade. O mercado de produtos e acessórios, como brinquedos, roupas e itens de higiene, também está em expansão, com estimativas de movimentar cerca de R$ 12 bilhões. A demanda por itens de luxo e personalizados reflete a disposição dos consumidores em gastar mais para garantir o conforto e a felicidade de seus animais.
No entanto, é importante considerar os desafios que acompanham essa crescente humanização. O envelhecimento da população brasileira e a aversão dos jovens ao trabalho formal podem complicar o planejamento financeiro para cuidados com os pets. Pets não contribuem para o sistema de seguridade social e não têm papel no financiamento das aposentadorias, o que pode levar a uma dependência maior dos donos para custear os cuidados futuros. A preocupação com quem cuidará dos pets, e quem cuidará dos donos na velhice, é uma questão que merece atenção.
Além disso, a inovação no mercado pet, com o surgimento de novas tecnologias e serviços, como dispositivos inteligentes e espaços pet-friendly, reflete uma mudança no comportamento dos consumidores. Os donos estão cada vez mais dispostos a investir em soluções que melhorem a qualidade de vida de seus animais e tornem seu dia a dia mais conveniente e confortável.
Em resumo, a humanização dos pets e o crescimento das famílias multiespécies estão moldando a economia brasileira de maneiras profundas e significativas. À medida que a legislação e o mercado se adaptam a essas mudanças, é crucial que tanto os consumidores quanto os profissionais de finanças estejam preparados para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades que surgem. O papel crescente dos pets em nossas vidas continuará a influenciar a economia, criando novas dinâmicas e exigindo uma abordagem cuidadosa e planejada para garantir o bem-estar de todos os envolvidos.
Paula Sauer, Economista e Planejadora Financeira CFP, coordenadora do Laboratório de Inteligência Financeira da ESPM.